(Artigo
publicado originalmente no Correio Braziliense)
POR LUIZ FLÁVIO GOMES* / **
89% dos jovens (18 a 24
anos) têm orgulho de ser brasileiros; 76% acreditam que o Brasil está mudando
para melhor e 86% afirmaram que o país é importante no mundo hoje (revelou a pesquisa Sonho
brasileiro, divulgada em 13/06/11). Razões? Acreditam no futuro de um país
promissor, afinal, detentor da 6ª economia mundial, sede da copa do mundo de
2014 e das olimpíadas de 2016, o Brasil é destaque internacional como polo de
investimento, desenvolvimento (ainda que não na velocidade que deveria) e oportunidades.
Incontestáveis os
avanços conquistados nas últimas décadas, porém, não tão virtuosos como se
poderia imaginar, diante dos cenários paradoxais que revelam um país muito aquém
do nível do orgulho nacional juvenil. O brilho de ostentar a 6ª posição na
economia mundial (Relatório
do Fundo Monetário Internacional, 2011) resulta ofuscado com o 73º
lugar no ranking internacional da igualdade social (o IDHAD - Índice de Desenvolvimento Humano
Ajustado à Desigualdade - Relatório de Desenvolvimento
Humano – PNUD) e praticamente apagado com a 4ª posição no ranking das
nações com pior distribuição de renda da América Latina (Relatório sobre cidades
latino-americanas da ONU).
De que vale ser o país
sede da copa do mundo e das olimpíadas, com investimentos bilionários em infraestrutura
e construção de estádios (os gastos estimados da Copa do Mundo do
Brasil subiram para R$ 27,4 bilhões, segundo estudo divulgado pelo Tribunal de
Contas da União - TCU), se, de acordo com o IPEA
(Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o Brasil ainda possui 16 milhões de
pessoas em situação de pobreza
extrema (ou seja, com renda mensal de até 70 reais)?
Embora a pesquisa
demonstre um sentimento otimista em relação ao Brasil, o país é extremamente
deficiente no tocante à
equidade no acesso à saúde, educação e renda, além de figurar como um dos
países mais violentos do mundo.
Somente em 2010, foram
assassinadas 52.260 pessoas, ou seja, 27,3 mortes por 100 mil habitantes (de
acordo com os dados disponibilizados pelo Datasus
– Ministério da Saúde). Com toda esta mortandade generalizada e
descontrolada, o Brasil é o 20º país mais homicida do mundo, atrás apenas de:
1º Honduras (taxa de 82,1 mortes/100mil), 2º El Salvador (66 mortes/100mil), 3º
Costa do Marfim (56,9 mortes/100mil), 4º Jamaica (52,1 mortes/100mil), 5º
Venezuela (49 mortes/100mil), 6º Belize (41,7 mortes/100mil), 7º Guatemala
(41,4 mortes/100mil), 8º Ilhas Virgens (39,2 mortes/100mil), 9º São Cristóvão e
Nevis (38,2 mortes/100mil), 10º Zâmbia (38 mortes/100mil), 11º Uganda (36,3
mortes/100mil), 12º Malauí (36 mortes/100mil), 13º Trindade e Tobago (35,2
mortes/100mil), 14º África do Sul (33,8 mortes/100mil), 15º Lesoto (33,6
mortes/100mil), 16º Colômbia 33,4 mortes/100mil), 17º Congo (30,8
mortes/100mil), 18º República da África Central (29,3 mortes/100mil) e 19º
Bahamas 28 mortes/100mil).
Note-se,
nenhum dos 19 países mais homicidas do mundo compõe as primeiras colocações no ranking
mundial da economia. Quando observadas suas taxas, equivalem às piores posições
no PIB (por exemplo, Honduras, El Salvador e Costa do Marfim, correspondem,
respectivamente a 109ª, 99ª e 97ª colocação no ranking). A mesma lógica é obtida
quando verificada as posições no ranking da violência dos 10 primeiros países
mais ricos do mundo (excetuando-se o Brasil), tendo em vista que os Estados
Unidos, China, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Rússia e Canadá,
ocupam, respectivamente, a 102ª, 174ª, 203ª, 192ª, 162ª, 173ª, 182ª, 67ª e 148ª
colocações no ranking mundial da violência.
Dentre
os dez países mais ricos do mundo, Brasil é o único que se encontra no Top 66,
visto que em segundo lugar vem a Rússia que ocupa a 67ª posição nesse ranking
maldito (o do extermínio massivo de seres humanos).
Com
todas as suas contradições, nitidamente atreladas à sua economia escravagista, fugimos
nitidamente da regra. Os ricos não são violentos ou não são tão violentos como
o Brasil. Mesmo ostentando o 6º lugar no PIB, também se
destaca como o país do morticídio massivo, o que revela o seguinte: deter um
dos maiores produto interno bruto do mundo não significa indicadores prósperos
na área social (saúde e educação), nem tampouco relacionados à distribuição de
renda do país. Grande país com os pés de barro.
Ser economicamente desenvolvido não significa, necessariamente, avanço
nas demais áreas. O Brasil é um país rico, mas não é um país de todos. Continua
muito desigual, miserável, doente, analfabeto e extremamente violento. Para que
a nação alcance níveis europeus de assassinatos, tal como os dez primeiros países
no ranking mundial da economia, a prioridade deve ser mais investimento na
esfera social, diminuindo as distâncias entre as extremidades.
Contrariando toda cultura sociológica (Gilberto Freyre, Sérgio
Buarque de Holanda etc.), nossos números revelam que nós não somos (ou não
somos ainda) um país pacífico (ou cordial). Não temos consistência social, ou
seja, não existe massa muscular sociocultural suficiente para justificar que 90%
dos jovens sintam-se orgulhosos do Brasil. É mais uma questão de percepção, de
subjetividade, de esperança, que de razão objetiva. O paradoxo não passa de um
retrato do otimismo injustificado do brasileiro ou, pior, da desinformação, da
ausência de conhecimento da realidade socioeconômica do país. Se de um lado a
ideia de que somos um país já universalmente próspero constitui um mito, uma
construção popular/política falaciosa (proposital ou não), de outro, ela não há
como negar que ela seja uma bandeira individual e coletiva que devemos
orgulhosamente levantar.
*LFG – Jurista e
professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto
Avante Brasil e coeditor do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de
Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).
Siga-me: www.professorlfg.com.br
** Colaborou: Natália
Macedo Sanzovo, Advogada, Pós
Graduanda em Ciências Penais, Coordenadora e Pesquisadora do Instituto Avante Brasil.
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