POR LUIZ FLÁVIO GOMES (@professorLFG)*
O
furto de uma galinha justifica a intervenção do Direito penal?
O
caso chegou até a Sexta Turma do STJ no julgamento do HC 243.958/MG (DJe
26/09/2012), relatado pela Min. Assusete Magalhães. Em Minas Gerais um homem
sofria ação penal porque tentou furtar uma galinha, avaliada em trinta reais. O
fato precisou ser analisado pelo Tribunal da Cidadania para que a ação penal
fosse trancada.
Paremos
para analisar o gasto (físico e econômico) que a máquina judiciária dispendeu
na análise deste fato. Muito mais que trinta reais, não é verdade?
É
esse tipo de situação que nós, defensores da aplicação do princípio da
insignificância, queremos evitar.
O
Estado, detentor do poder punitivo, deve se ocupar de fatos mais graves, mais
reprimíveis, do que o furto de uma galinha.
E
há instrumentos que fundamentam a exclusão destes fatos do Direito penal:
princípios como a intervenção mínima do direito penal e da insignificância, bem
lembrados nesta hipótese, pela Ministra Assussete Magalhães:
A tentativa de subtrair uma
galinha, avaliada em R$ 30,00 (trinta reais), "embora se amolde à
definição jurídica do crime de furto tentado, não ultrapassa o exame da
tipicidade material, mostrando-se desproporcional a imposição de pena privativa
de liberdade, uma vez que a ofensividade da conduta se mostrou mínima; não
houve nenhuma periculosidade social da ação; a reprovabilidade do comportamento
foi de grau reduzidíssimo e a lesão ao
bem jurídico se
revelou inexpressiva"
Quem
cuida de coisas pequenas, insignificantes, reduz sua alma também à
insignificância. O populismo penal midiático escandalosamente repressivo está
embotando o cérebro das pessoas, incluindo a de alguns juízes que, muitas
vezes, já foi bastante danificado pelos jogos na internet, em razão do excesso
de dopamina. A neurocientista inglesa Susan Greenfield bem explica: o excesso
de dopamina afeta a parte pré-frontal do cérebro que, não ativada, conduz à
perda do senso de si mesmo, da noção de tempo e de espaço, incentiva a
depressão etc. Para quem tem excesso de dopamina o mundo fica sem significado,
perde-se a noção de valores, a sensibilidade para o justo e o proporcional.
Quanto mais dopamina menos funcionamento do pré-frontal. Quando tudo isso
acontece na cabeça de um juiz, vai-se embora sua sensibilidade, sua noção de
proporcionalidade etc. Quando o furto de uma galinha necessita da intervenção
de uma Ministra do STJ para dizer que isso não faz parte do direito penal, algo
de muito errado ronda o mundo das cabeças de alguns juízes.
*LFG – Jurista e professor.
Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e
coeditor do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983),
Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Siga-me: www.professorlfg.com.br.
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