LUIZ FLÁVIO GOMES (@professorLFG)*
É possível que um país esteja em plena guerra civil sem
nenhum tipo de revolução e de protestos organizados? Vendo os números da
violência no nosso país, a resposta só pode ser positiva. E tudo se passa
dentro de uma normalidade incrível. É como se nada estivesse ocorrendo. Devemos
nos render à habilidade da oligarquia reinante, formada pelo Governo, pela
mídia e pelos poderes econômicos e políticos, de não deixar transparecer nada
de anormal. Tudo faz parte da normalidade. Tudo foi internalizado,
naturalizado. O sangue jorra por todas as vias da nação, mas ninguém presta
atenção nos milhares de mortos (Zaffaroni).
Violência epidêmica. Com a taxa de 27,3 homicídios dolosos
para cada 100 mil habitantes, o Brasil é um país com alto nível de violência
epidêmica. A OMS (Organização Mundial de Saúde) estabelece que quando a taxa é
superior a 10 homicídios por 100 mil habitantes, o local é considerado uma zona
epidêmica de homicídios, tendo o Brasil superado em quase 3 vezes este índice. A
taxa citada somada aos demais óbitos violentos no país (v.g., as mortes
ocorridas no trânsito brasileiro, que apenas em 2010 vitimou 42.844) faz do
Brasil um país homicida. Não se trata de mera opinião ou de um posicionamento
ideológico, mas sim de um fato (estatisticamente incontestável) (Datasus).
Um assassinato a cada 9
minutos. Na última década (2001-2010) o crescimento foi de 9% no número
absoluto de homicídios, vez que em 2001 constatou-se 47.943 mortes e, 52.260,
em 2010, gerando uma média de crescimento anual de homicídios de 1,48%. A
partir desta média de crescimento anual (1,48%), foi obtida a seguinte
estimativa para o ano de 2012: 53.823 homicídios. O que significa: 4.485 homicídios por mês, 147
por dia, 6 por hora ou, 1 assassinato a cada 9 minutos e 48 segundos (ou 587.526
milisegundos) (o
levantamento foi realizado pelo Instituto Avante Brasil – IAB, a partir dos
dados disponibilizados pelo DATASUS - Ministério da Saúde).
11% de
todas as mortes do planeta em 2010. De acordo com o UNODC (United Nations
Office on Drugs and Crime - Homicide Statistics – 2010), 468 mil pessoas foram
assassinadas em 2010, em todo o planeta. Os números não são totalmente
confiáveis, de qualquer modo, dão uma ideia (ainda que só aproximada) dessa
impressionante realidade. A taxa média global é de 6,9 mortes para cada 100 mil
habitantes. As médias dos respectivos continentes são: África, 17 por 100 mil
habitantes; América, 16 por 100 mil habitantes e Ásia, Europa e Oceania, 3 a 4
por 100 mil habitantes.
Do total de
assassinatos do planeta o percentual de cada continente é o seguinte: 36%,
África; 31%, Américas; 27%, Ásia; 5%, Europa e 1%, Oceania. No Brasil, em 2010,
conforme dados do Datasus, foram assassinadas 52.260 pessoas, ou seja, o
equivalente a 11% de todas as mortes mundiais.
Guerra
civil não declarada. Se a estimativa é de 147 vítimas diárias de homicídios
dolosos (em 2012), se ocorre uma morte a cada 9 minutos, se 11% de todas as
mortes do planeta acontecem no Brasil, não há como deixar de concluir que a
guerra civil está factualmente caracterizada. Não aquela proveniente de
conflitos armados, sim, guerra discriminatória e étnica. A desigualdade e a
seletividade são as bases da guerra civil brasileira. Uma espécie de guerra
“camuflada” contra os discriminados étnicos (os segregados, os excluídos, os
desamparados), contra os vulneráveis (especialmente os jovens), exploráveis,
torturáveis, “prisionáveis” e “mortáveis”. Não se trata, no entanto, de uma guerra
com milhares de mortes num pequeno lapso de tempo (Hiroshima, por exemplo). São
assassinatos a conta-gotas, como diz Zaffaroni, e totalmente naturalizados pela
população e pela oligarquia brasileiras. A história do Brasil está sendo
escrita com tinta e sangue.
*LFG – Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG.
Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e coeditor do
atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de
Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Estou no www.professorlfg.com.br.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
AVISO: Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do ICHU NOTÍCIAS.
Neste espaço é proibido comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros. Administradores do ICHU NOTÍCIAS pode até retirar, sem prévia notificação, comentários ofensivos e com xingamentos e que não respeitem os critérios impostos neste aviso.