LUIZ FLÁVIO GOMES (@professorLFG)*
A
novela da dosimetria da pena na AP 470 (mensalão) está longe do seu final.
Ainda há muita água para passar debaixo dessa complicada ponte. O novo depoimento
de Marcos Valério - revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo -, prestado em
setembro ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pode favorecê-lo na
redução ou mesmo extinção da sua pena.
Possivelmente
por razões processuais ou estratégicas, o procurador-geral disse que eventual
delação não teria efeito dentro do processo mensalão. Na prática, nada disso
representa a verdade dos fatos e do direito. O processo ainda não terminou,
logo, é perfeitamente possível a delação. Aliás, nem sequer a pena do réu
Marcos Valério foi totalmente definida. Falta o voto do Ministro Marco Aurélio
em relação a duas acusações contra ele. O STF ainda nada decidiu sobre a
existência ou não de crime continuado, o que pode significar uma grande redução
de pena.
Marcos
Valério, ademais, independentemente das suas declarações de setembro, já se
posicionou como colaborador da Justiça no processo, em 2005, visto que foi ele
quem ofereceu a lista de todas as pessoas, sobretudo parlamentares, que receberam
dinheiro ilícito. Também foi ele quem deu detalhes de todos os falsos
empréstimos bancários. Ele já colaborou com a Justiça e, segundo a Veja, ainda está disposto a oferecer
mais detalhes para esclarecer a participação do ex-presidente Lula assim como do
ex-ministro Antonio Palocci. Quer ainda delatar mais remessas de dinheiro para
o exterior, a entrega de dinheiro a um empresário no caso da morte do prefeito
de Santo André, Celso Daniel, quem deu dinheiro para os petistas “aloprados”
etc.
No
final de setembro Marcos Valério enviou fax ao Supremo pedindo sua inclusão no
programa de proteção a testemunha assim como um novo depoimento. Toda delação
deve sempre ser vista com reservas. Sua credibilidade depende do conteúdo do
que é revelado assim como de provas que confirmem as declarações. Delação
desacompanhada de provas convincentes não favorece em nada o réu. A partir dela
podem ser abertas novas investigações, contra as pessoas incriminadas.
A
lei exige que a delação seja efetiva (empenho exitoso, fornecimento de dados
objetivos, participação ativa nas diligências) e voluntária (livre, sem
coação). Além disso, que haja um resultado prático que pode ser ou a
identificação dos demais coautores ou partícipes da ação criminosa ou a
recuperação total ou parcial do produto do crime.
Quando
preenchidos todos os requisitos legais, os Ministros do STF devem levar em
conta a colaboração do réu (não é uma faculdade, é um dever) ou para reduzir a
pena de 1/3 a 2/3 ou inclusive para conceder o perdão judicial, julgando-se
extinta a pena. A lei concede ao juiz uma grande margem de atuação, que ainda
deve considerar as circunstâncias, a gravidade assim como a repercussão social
do fato criminoso.
Juridicamente
tudo isso é possível em razão da lei de proteção de vítima e testemunha, de
1999.
Tendo
havido menção a Lula em seu depoimento, a oposição (PPS, PSDB e DEM) anunciou
no último dia 01.11.12 que pedirá a abertura de investigação para apurar sua possível
participação no esquema do mensalão. Fonte: Estadão - http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,oposicao-pedira-investigacao-contra-lula,954438,0.htm
Teoricamente
tudo isso também é possível, mas não basta a delação isolada. Ela só ganha
relevância quando acompanhada de provas objetivas que revelem plausibilidade
jurídica em relação ao seu conteúdo.
*LFG
– Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do
Instituto Avante Brasil e coeditor do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor
de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a
2001). Estou no www.professorlfg.com.br.
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