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terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

‘Muitos prefeitos vão ficar em 2° para tentar derrubar o 1°’, diz Quitéria sobre eleições 2016

Maria Quitéria, presidente da UPB
No último ano no comando da União dos Municípios da Bahia (UPB), Maria Quitéria (PSB) tem pela frente mais um período de pautas e desafios. Além da previsão de continuidade nos cortes de verbas para os municípios, 2016 também terá eleições com proibição de doações de empresas. 
 
Para a prefeita de Cardeal da Silva, cidade no agreste do estado, o pleito pode dar início a uma era de mudanças, mas com efeitos visíveis em disputas futuras. "Eu acho que a gente vai ter uma melhora, mas não agora […] vai ter muito prefeito pedindo para ficar em segundo lugar para tentar derrubar o primeiro.”, disse em entrevista ao Bahia Notícias. 
Ainda na conversa com o BN, Quitéria falou também da briga que a UPB pretende engrossar, junto com entidades nacionais, sobre a repatriação de multas sobre bens declarados no exterior. A gestora ainda opinou sobre possibilidade de demissões, comentou a respeito da falta de capacitação nas prefeituras e lamentou o fato de a Bahia “não viver do turismo”
 
Leia abaixa a entrevista na íntegra:
Maria Quitéria (PSB)
Quais as principais pautas da UPB para 2016?
Como o ano vai ser de eleição, a gente vai focar nas questões eleitorais com o TRE [Tribunal Regional Eleitoral]. Já na parte administrativa, 2016 vai ser de desafios e superações para os prefeitos, mas a UPB acredita no potencial dos municípios. Tem cidades que estão em desenvolvimento turístico, tem cidades que fazem desenvolvimento local através do programa do micro e pequeno empreendedor [Sebrae] e isso gera alternativa para a vida das pessoas.
 
A senhora poderia citar algumas dessas cidades?
Municípios que ganharam prêmio de empreendedorismo no Sebrae, como Jacobina, Guanambi, Teixeira de Freitas, Serrinha. Acho que a grande questão de 2016 é transformar dificuldade em oportunidade.
 
A senhora vai para a Brasília agora no começo de fevereiro. A UPB vai continuar na mesma linha do questionamento da distribuição do bolo tributário para conseguir uma maior arrecadação para os municípios?  
Acho que o grande enfrentamento ainda é a distribuição desse bolo tributário. A arrecadação dos impostos pagos por nós cidadãos do Brasil ainda está concentrada na União. Por isso que a nossa meta, como prefeitos que absorveram depois da Constituição de 1988 mais de 200 programas federais, é ter uma distribuição que seja justa para poder devolver ao povo aquilo que é pago. Quem tem capacidade de arrecadar mais recebe menos da União e quem tem capacidade de arrecadar menos recebe mais.
 
Ano passado nós tivemos um bloqueio de verbas. Os municípios chiaram, com razão, e para 2016 esse contingenciamento pode (ver o valor) ser maior. Qual o recado para que os prefeitos baianos segurem as contas?
Olha vai ser mais difícil. A gente tem uma missão no Congresso Nacional que é derrubar o veto da presidenta feito em 14 de janeiro em relação à repatriação das multas sobre bens [não declarados à Receita Federal mantidos no exterior]. Essas multas serão vultosas. O governo federal está apostando nisso para poder equilibrar as finanças dele. Só que os municípios também perderam e os estados também. Como a gente vai ter um declínio na economia, isso serviria para equilibrar as nossas finanças. A gente precisa derrubar esse veto para que se tenha pelo menos a mesma fonte de receita da União e também compensar o que a gente perdeu em bilhões com as desonerações do IPI [Imposto sobre Produtos Industrializados].
 
A senhora acredita que em 2016 teremos mais prefeitos e Câmaras de Vereadores com contas rejeitadas?
Se a Lei [de Responsabilidade Fiscal] não for modificada, sem dúvida nenhuma. Tem um projeto do [deputado federal] Roberto Brito, que já foi aprovada em uma comissão da Câmara [de Assuntos Econômicos e de Desenvolvimento Nacional], que seria tirar os programas federais do nosso cálculo do índice de pessoal. A maioria dos casos de contas rejeitadas foi por problemas no índice de pessoal. Por mais que o Tribunal [de Contas dos Municípios] seja sensível às prefeituras, a questão está na lei. Em 2015 foram 114 contas rejeitadas.
 
Nesse ano, as prefeituras vão ter mais despesas como o aumento no salário mínimo e do novo piso para os professores. Vem mais gastos aí. Como gerir isso?
Com o aumento do mínimo para R$ 880, o impacto será de R$ 321,4 milhões nas despesas em nível de Bahia. Em relação à educação, quando você avalia a região Nordeste, que é populosa, a gente sabe que tem um déficit com a educação. Muitos municípios aderiram à escola em tempo integral. Temos creches a serem construídas. A gente olha que a Undime [União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação] tem lutado pelo setor, mas pelo fato de ter como presidente uma pessoa de São Paulo, eu acho que muitas questões são desconsideradas por não se conhecer a realidade do Nordeste. Por isso, eu acho que a gente ainda é discriminado. 
 
O presidente da APLB-BA, Rui Oliveira, reclamou que 92% das prefeituras baianas não pagam o piso dos professores.
Nós não queremos diminuir salário de professor. Só que tem casos de municípios, como o meu [Cardeal da Silva] onde aprovamos planos de cargos e salários. A gente deu vantagens aos professores pela inexistência do piso na época. Só que esse piso hoje cresceu muito e teve um aumento exorbitante no bojo do valor que recebemos da União. E se a União garantiu que o Brasil teria o [programa] Pátria Educadora, que teria incentivos como o Pré-Sal para a Educação, a gente esperava também mais recursos para a educação. Então, em nenhum momento eu sentei para discutir cargos e salários no meu município. A maioria dos prefeitos se sentiu já coagido porque pegaram planos aprovados. A gente teve uma eleição em 2012 que entrou 298 novos prefeitos eleitos. Muitos pegaram os municípios como os planos já aprovados, só que a receita dos municípios não cresceu. E tem lugar que está em situação de emergência por seca e que precisa de recursos para alocar em outras áreas.
 
Qual é o perfil do prefeito do interior baiano hoje? Falo de um prefeito mais moderno, preocupado com as contas públicas, que não usa a prefeitura como cabide de emprego?
Hoje, nós temos prefeitos muito competentes e sérios. Eu tenho testemunhado isso.  Eles têm buscado informação, conhecimento, e cada dia mais estão se modernizando e se equipando. Mas ainda existe um problema sério de capacitação. Hoje, o mercado de trabalho exige muito que a gente tenha na prefeitura pessoas capacitadas, e aí às vezes tem de trazer alguém de outra cidade, da capital, por exemplo.
 
Ainda há muita gente conservadora, atrasada?
Não digo que atrasada, mas ainda que desconhece as mudanças de leis e gestão. Agora mesmo, o TCM colocou tudo informatizado. A gente está tendo um período curto, mas pedimos prorrogação, e eles deram seis meses de adaptação para você enviar tudo em meio eletrônico. Isso é novo. Hoje, a gente tem site de transparência, as pessoas têm acesso à informação diferente de outros tempos. E nisso, você tem que fazer a contabilidade diária e isso demanda qualidade e pessoal qualificado e bem-remunerado. Que é o nosso grande problema. Você pode até capacitar, mas pagar um servidor que trabalhe sábado e domingo para atualizar sistema diariamente, com salário de R$ 800, R$ 1 mil, é muito pouco.
 
A senhora prevê mais demissões em 2016?
Olha, acho que muita gente já demitiu o que tinha de demitir no ano passado. Muitas prefeituras tiveram contas rejeitadas porque não tiveram coragem de demitir para assim preservar serviços essenciais, como saúde e educação. Mas a gente não ver só demissão pela questão de ultrapassar o índice de pessoal, a gente vê pela questão financeira mesmo. Tem prefeitura que não pagou ainda o mês de dezembro, não pagou o 13° salário. Tem muitos, que como eu, deixam de pagar o fornecedor para pagar a folha de funcionário.
 
A senhora precisou demitir funcionário em Cardeal da Silva?
Claro. Porque meu índice de arrecadação é de 0,6 do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). É o menor índice do FPM. Eu tive que cortar duas secretarias para poder adequar ao meu índice.
 
Esse ano tem eleição e será a primeira com a proibição de doações de empresas. A senhora acredita que teremos uma campanha mais limpa, ou os prefeitos e candidatos vão encontrar brechas na lei e repetir práticas viciadas?
A gente ainda vai precisar de um bom tempo de educação para as pessoas entenderem o que é a política de fato, quais são os interesses que o politico tem que ter. Eu acho que a gente vai ter uma melhora, mas não agora. Agora, vai ter muito prefeito pedindo para ficar em segundo lugar para tentar derrubar o primeiro. Vai ser isso nesta eleição. O segundo vai ficar torcendo para que o primeiro erre. Porque na maioria dos prefeitos que são candidatos no interior, os próprios doadores são eles mesmos. Não tem isso de empresas. Só nas cidades maiores é que tem financiamento de empresas privadas.
 
A senhora está encerrando seu mandato como presidente da UPB neste ano. O que foi que a senhora não fez que pretende fazer agora?
Olha, lá na UPB minha luta sempre vai ser a bandeira do pacto federativo. Já chegou o momento de se distribuir de fato as riquezas do país para todas as regiões. Eu sonho muito também que a Bahia se torne um estado turístico. Eu queria fazer muito a Feira dos Municípios. Só que de 2009 para cá, as cidades perderam muita receita. Eu, como sou apaixonada pelo turismo e já fui secretária de turismo [na cidade de Penedo, em Alagoas], acredito que a Bahia poderia viver muito mais do turismo do que da indústria. Quanto de turismo a gente poderia ganhar com a Chapada, com a região sul, Porto Seguro, e outros locais. Ah, se fala que o Rio de Janeiro é um destino e tal. A gente tem tudo em um só estado. Eu, quando era secretária de turismo, ia atrás do pessoal da limpeza e da iluminação, e dizia que uma cidade boa de visitar é aquela boa de viver. Então, ela vai se transformar em uma cidade boa de viver quando ela se transformar em uma cidade turística. Eu acho que a Bahia precisa viver do turismo. A gente ainda não vive do turismo.
 
Extraída do Bahia Notícias

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