A três dias de tomar posse como presidente, Jair Bolsonaro (PSL) afirmou
neste sábado (29) que pretende assinar um decreto para permitir a posse
de arma de fogo a todas as pessoas sem ficha criminal.
"Por decreto, pretendemos garantir a posse de arma de fogo para o
cidadão sem antecedentes criminais, bem como tornar seu registro
definitivo", escreveu o presidente eleito, nas redes sociais.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, o tema teria sido discutido em reunião
dos futuros ministros na última quinta-feira (27), e a medida foi
sugerida como prioritária pelo futuro ministro da Justiça, Sergio Moro,
como ato a ser feito nos primeiros cem dias do novo governo.
Uma política mais permissiva à posse de armas é promessa de campanha de Bolsonaro. Durante o período eleitoral, ele falou em revogar o Estatuto do Desarmamento, o que exigiria aprovação do Congresso, diferentemente de um decreto, que depende apenas de ação do Executivo.
A oposição reagiu. Para o líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS), esse anúncio de um decreto não é uma surpresa, já que Bolsonaro informou que tomaria a iniciativa durante a campanha eleitoral. "As consequências desse ato deverão ser creditadas apenas a ele", afirmou o petista.
A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, disse que o novo governo quer "instaurar o faroeste no Brasil" e que a população sofrerá por essa iniciativa. "Moro e Bolsonaro, que já anunciaram transformar o país em um estado policial, querem também instaurar o faroeste no Brasil. Ainda choraremos essa medida."
Já os presidentes da Câmara e do Senado preferiram não comentar. "Vamos aguardar o ato publicado", disse o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). O senador Eunício Oliveira (MDB-CE) ressaltou que só pode fazer uma avaliação após discutir com a área técnica se a iniciativa é viável por meio de um decreto presidencial.
Ainda neste sábado, duas horas após ter feito a primeira postagem, o presidente eleito voltou às redes sociais para detalhar o impacto de um decreto sobre a posse de armas.
“A expansão temporal será de intermediação do Executivo, entretanto outras formas de aperfeiçoamento dependem também do Congresso Nacional, cabendo o envolvimento de todos os interessados”, escreveu, sem dar detalhes, por exemplo, sobre quanto tempo deverá valer a posse com o novo decreto nem quais pontos devem ser alterados por meio de projetos de lei a serem discutidos no Congresso.
A posse de arma tratada agora por Bolsonaro, porém, é diferente do porte, já que uma pessoa que tem o direito de ter o dispositivo em casa não está autorizada a transportar o objeto consigo.
O porte é proibido para os cidadãos brasileiros, exceto para membros de Forças Armadas, polícias, guardas, agentes penitenciários e empresas de segurança privada, entre outros. É preciso demonstrar a necessidade do porte por exercício de atividade profissional de risco.
No entendimento da advogada e deputada estadual eleita Janaina Paschoal (PSL-SP), ao mencionar a expansão temporal, Bolsonaro se refere à duração das licenças. "Ele defende que pode fazer isso por decreto e que algo mais radical dependeria do Congresso", ela afirmou, concordando com a proposição.
"A proibição praticamente absoluta a possuir uma arma não decorre da lei, mas das muitas normas administrativas, portarias, resoluções etc. Antes de baixar um decreto, entendo que ele deveria pedir um levantamento de todas as normas administrativas que restringem a lei e simplesmente revogá-las."
MENOS BUROCRACIA
Nos anos de 2016 e 2017, o presidente Michel Temer (MDB) editou decreto que já havia ampliado de três para cinco o período de registro de armas. Diferentemente do trâmite para o porte de arma, a posse já é considerada minimamente acessível ao cidadão atualmente.
Agora, segundo apurou a reportagem, a principal alteração via decreto deverá ser a de esclarecer o que se entende sobre "efetiva necessidade", como consta na lei. Com isso, a ideia seria deixar explícita a flexibilização para o acesso.
O que vem sendo discutido internamente na equipe de Moro é fazer um decreto que altere aquele que regulamentou o Estatuto do Desarmamento em 2004. É uma forma de não precisar mexer na lei.
Em reuniões na semana passada, o pedido feito pelos principais auxiliares do presidente eleito é tirar todos os tipos de regra que possam dificultar a vida das pessoas. Também nesse sentido, a ideia é tornar o registro efetivo, sem necessidade de renovações, como escreveu Bolsonaro em rede social.
A posse de armas atualmente no Brasil é regulamentada pela lei federal 10.826, de 2003, conhecida como o Estatuto do Desarmamento. De acordo com ela, são necessárias algumas condições para que um cidadão tenha uma arma em casa, como por exemplo ser maior de 25 anos, ter ocupação lícita e residência certa, não ter sido condenado ou responder a inquérito ou processo criminal, comprovar a capacidade técnica e psicológica para o uso do equipamento e declarar a efetiva necessidade da arma.
Hoje a declaração de necessidade é feita pela Polícia Federal, que pode recusar o registro se entender que não há motivos de posse para o solicitante. Segundo especialistas, uma pessoa que mora em um local ermo, afastado de delegacias e batalhões de polícia, ou alguém ameaçado, por exemplo, tem mais chances de conseguir a autorização. O rigor com a comprovação da necessidade também pode variar de acordo com o estado e a cultura local.
Caçadores, colecionadores e atiradores desportivos também podem ter a posse de armas, mas o registro é realizado pelo Exército e segue critérios específicos para cada categoria. Para atiradores, por exemplo, é preciso comprovar a participação em clubes de tiro e competições.
A posse, de acordo com a lei, significa que o proprietário pode manter a arma apenas no interior da sua casa ou no seu local de trabalho, desde que seja o responsável legal pelo estabelecimento.
Apesar dos limites, cerca de seis armas são vendidas por hora no mercado civil nacional, segundo dados do Exército obtidos via lei de acesso à informação pelo Instituto Sou da Paz. Neste ano, até 22 de agosto, haviam sido vendidas 34.731 armas no total.
Além das vendas recentes, o número de novas licenças para pessoas físicas, concedidas pela Polícia Federal, tem crescido consistentemente nos últimos anos. Passou de 3.029, em 2004, para 33.031, em 2017.
O número de novos registros para colecionadores, caçadores e atiradores desportivos, dados pelo Exército, também subiu. Em 2012, foram 27.549 e, em 2017, 57.886. No total, hoje, são mais de meio milhão de armas nas mãos de civis: 619.604.
Além da alteração de Temer em 2016, outras medidas flexibilizaram a lei nos últimos anos. Uma portaria do Exército, de 2017, também significou um afrouxamento do estatuto. A medida permite que atiradores desportivos levem suas armas, carregadas com munição, até o local de tiro.
Segundo levantamento do Sou da Paz, há mais de 160 propostas em tramitação no Congresso para alterar o estatuto. Muitas pedem o porte de armas para categorias profissionais, como advogados, caminhoneiros e taxistas. No Senado, tramita um projeto para convocar um plebiscito de revogação do estatuto.
Para os contrários ao Estatuto do Desarmamento, a lei "desarmou cidadãos de bem" e não impediu o acesso de criminosos a armas. Eles afirmam que o estatuto não evitou o aumento da taxa de homicídio, hoje em cerca de 30,8 para cada 100 mil habitantes, em um total de 63.880 em 2017.
A cada 1% a mais de armas de fogo em circulação, os homicídios aumentam 2%, segundo pesquisa do economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Daniel Cerqueira, conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Em 2016, 71,1% dos 62.517 homicídios no Brasil foram causados por armas de fogo, de acordo com o Atlas da Violência, do Ipea e do Fórum.
Segundo o Atlas, estima-se que, sem o Estatuto do Desarmamento, os homicídios teriam crescido 12% além do observado.
Defensores do estatuto afirmam também que há um risco de desvio de armas legais para o crime. Uma pesquisa de 2015 do Ministério Público de São Paulo e o Instituto Sou da Paz apontou que 87% das armas usadas em homicídios na cidade eram de fabricação nacional e já foram, em algum momento, legais.
Uma política mais permissiva à posse de armas é promessa de campanha de Bolsonaro. Durante o período eleitoral, ele falou em revogar o Estatuto do Desarmamento, o que exigiria aprovação do Congresso, diferentemente de um decreto, que depende apenas de ação do Executivo.
A oposição reagiu. Para o líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS), esse anúncio de um decreto não é uma surpresa, já que Bolsonaro informou que tomaria a iniciativa durante a campanha eleitoral. "As consequências desse ato deverão ser creditadas apenas a ele", afirmou o petista.
A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, disse que o novo governo quer "instaurar o faroeste no Brasil" e que a população sofrerá por essa iniciativa. "Moro e Bolsonaro, que já anunciaram transformar o país em um estado policial, querem também instaurar o faroeste no Brasil. Ainda choraremos essa medida."
Já os presidentes da Câmara e do Senado preferiram não comentar. "Vamos aguardar o ato publicado", disse o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). O senador Eunício Oliveira (MDB-CE) ressaltou que só pode fazer uma avaliação após discutir com a área técnica se a iniciativa é viável por meio de um decreto presidencial.
Ainda neste sábado, duas horas após ter feito a primeira postagem, o presidente eleito voltou às redes sociais para detalhar o impacto de um decreto sobre a posse de armas.
“A expansão temporal será de intermediação do Executivo, entretanto outras formas de aperfeiçoamento dependem também do Congresso Nacional, cabendo o envolvimento de todos os interessados”, escreveu, sem dar detalhes, por exemplo, sobre quanto tempo deverá valer a posse com o novo decreto nem quais pontos devem ser alterados por meio de projetos de lei a serem discutidos no Congresso.
A posse de arma tratada agora por Bolsonaro, porém, é diferente do porte, já que uma pessoa que tem o direito de ter o dispositivo em casa não está autorizada a transportar o objeto consigo.
O porte é proibido para os cidadãos brasileiros, exceto para membros de Forças Armadas, polícias, guardas, agentes penitenciários e empresas de segurança privada, entre outros. É preciso demonstrar a necessidade do porte por exercício de atividade profissional de risco.
No entendimento da advogada e deputada estadual eleita Janaina Paschoal (PSL-SP), ao mencionar a expansão temporal, Bolsonaro se refere à duração das licenças. "Ele defende que pode fazer isso por decreto e que algo mais radical dependeria do Congresso", ela afirmou, concordando com a proposição.
"A proibição praticamente absoluta a possuir uma arma não decorre da lei, mas das muitas normas administrativas, portarias, resoluções etc. Antes de baixar um decreto, entendo que ele deveria pedir um levantamento de todas as normas administrativas que restringem a lei e simplesmente revogá-las."
MENOS BUROCRACIA
Nos anos de 2016 e 2017, o presidente Michel Temer (MDB) editou decreto que já havia ampliado de três para cinco o período de registro de armas. Diferentemente do trâmite para o porte de arma, a posse já é considerada minimamente acessível ao cidadão atualmente.
Agora, segundo apurou a reportagem, a principal alteração via decreto deverá ser a de esclarecer o que se entende sobre "efetiva necessidade", como consta na lei. Com isso, a ideia seria deixar explícita a flexibilização para o acesso.
O que vem sendo discutido internamente na equipe de Moro é fazer um decreto que altere aquele que regulamentou o Estatuto do Desarmamento em 2004. É uma forma de não precisar mexer na lei.
Em reuniões na semana passada, o pedido feito pelos principais auxiliares do presidente eleito é tirar todos os tipos de regra que possam dificultar a vida das pessoas. Também nesse sentido, a ideia é tornar o registro efetivo, sem necessidade de renovações, como escreveu Bolsonaro em rede social.
A posse de armas atualmente no Brasil é regulamentada pela lei federal 10.826, de 2003, conhecida como o Estatuto do Desarmamento. De acordo com ela, são necessárias algumas condições para que um cidadão tenha uma arma em casa, como por exemplo ser maior de 25 anos, ter ocupação lícita e residência certa, não ter sido condenado ou responder a inquérito ou processo criminal, comprovar a capacidade técnica e psicológica para o uso do equipamento e declarar a efetiva necessidade da arma.
Hoje a declaração de necessidade é feita pela Polícia Federal, que pode recusar o registro se entender que não há motivos de posse para o solicitante. Segundo especialistas, uma pessoa que mora em um local ermo, afastado de delegacias e batalhões de polícia, ou alguém ameaçado, por exemplo, tem mais chances de conseguir a autorização. O rigor com a comprovação da necessidade também pode variar de acordo com o estado e a cultura local.
Caçadores, colecionadores e atiradores desportivos também podem ter a posse de armas, mas o registro é realizado pelo Exército e segue critérios específicos para cada categoria. Para atiradores, por exemplo, é preciso comprovar a participação em clubes de tiro e competições.
A posse, de acordo com a lei, significa que o proprietário pode manter a arma apenas no interior da sua casa ou no seu local de trabalho, desde que seja o responsável legal pelo estabelecimento.
Apesar dos limites, cerca de seis armas são vendidas por hora no mercado civil nacional, segundo dados do Exército obtidos via lei de acesso à informação pelo Instituto Sou da Paz. Neste ano, até 22 de agosto, haviam sido vendidas 34.731 armas no total.
Além das vendas recentes, o número de novas licenças para pessoas físicas, concedidas pela Polícia Federal, tem crescido consistentemente nos últimos anos. Passou de 3.029, em 2004, para 33.031, em 2017.
O número de novos registros para colecionadores, caçadores e atiradores desportivos, dados pelo Exército, também subiu. Em 2012, foram 27.549 e, em 2017, 57.886. No total, hoje, são mais de meio milhão de armas nas mãos de civis: 619.604.
Além da alteração de Temer em 2016, outras medidas flexibilizaram a lei nos últimos anos. Uma portaria do Exército, de 2017, também significou um afrouxamento do estatuto. A medida permite que atiradores desportivos levem suas armas, carregadas com munição, até o local de tiro.
Segundo levantamento do Sou da Paz, há mais de 160 propostas em tramitação no Congresso para alterar o estatuto. Muitas pedem o porte de armas para categorias profissionais, como advogados, caminhoneiros e taxistas. No Senado, tramita um projeto para convocar um plebiscito de revogação do estatuto.
Para os contrários ao Estatuto do Desarmamento, a lei "desarmou cidadãos de bem" e não impediu o acesso de criminosos a armas. Eles afirmam que o estatuto não evitou o aumento da taxa de homicídio, hoje em cerca de 30,8 para cada 100 mil habitantes, em um total de 63.880 em 2017.
A cada 1% a mais de armas de fogo em circulação, os homicídios aumentam 2%, segundo pesquisa do economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Daniel Cerqueira, conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Em 2016, 71,1% dos 62.517 homicídios no Brasil foram causados por armas de fogo, de acordo com o Atlas da Violência, do Ipea e do Fórum.
Segundo o Atlas, estima-se que, sem o Estatuto do Desarmamento, os homicídios teriam crescido 12% além do observado.
Defensores do estatuto afirmam também que há um risco de desvio de armas legais para o crime. Uma pesquisa de 2015 do Ministério Público de São Paulo e o Instituto Sou da Paz apontou que 87% das armas usadas em homicídios na cidade eram de fabricação nacional e já foram, em algum momento, legais.
Por Talita Fernandes | Folhapress
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