Em pronunciamento realizado na manhã desta sexta-feira
(24), o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, confirmou a
sua saída do governo federal. A entrega do cargo acontece após a
exoneração do diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo.
Durante o pronunciamento, Moro citou "inteferência política" na
exoneração.
O Diário Oficial da União (DOU) de hoje trouxe a exoneração de Maurício Valeixo do posto de diretor-geral do órgão (veja aqui),
contrariando Moro, que avisou que se demitiria se isso fosse feito.
Pelo menos até a noite de quinta (23), outros ministros tentavam
negociar a permanência do ex-juiz no governo, mas a demissão do
comandante da PF antes da conclusão das tratativas pode ter atrapalhado a
reversão.
"Busquei postergar essa decisão, até sinalizando que poderia
concordar no futuro. Pensei até que poderia ser feito, mas tive a
sinalização de que seria um grande equívoco. Conversei com o presidente,
houve essa insistência e disse que seria interferência política",
explicou.
Durante seu discurso, Moro destacou o trabalho realizado
enquanto ministro e afirmou que "não houve um combate tão efetivo à
criminalidade no Brasil".
"A palavra tem sido integração. Atuamos muito próximos das
forças de segurança estaduais e municipais. Nós realmente trabalhamos
duro contra a criminalidade. Ouso dizer não houve um combate tão efetivo
à criminalidade como foi nesta gestão. Trabalhando com os governos.
Tivemos o caso da transferência das lideranças do PCC. Tivemos
recentemente a prisão da maior autoridade do PCC. Tivemos recorde de
apreensão de drogas. É importante tirar drogas das ruas. Feito pela
Polícia Federal e pela Polícia Rodoviária Federal. Tivemos recorde de
destruição de plantações de maconha, apreensão de produtos do crime,
principalmente pela Polícia Federal. Pregamos a Força Nacional em todo
território e acredito que ela deveria ser fortalecida", disse.
Moto também falou sobre a importância do Poder Executivo não
interferir em ações da Polícia Federal e citou a época da Operação Lava
Jato.
"Antes de assumir o cargo, eu fui juiz federal por 23 anos,
tive diversos casos criminais relevantes e desde 2014, em particular,
tivemos a Lava Jato. Mudou o patamar de combate à corrupção. Existe
muito a ser feito, mas o cenário foi modificado. Foi um trabalho do
judiciário, do Ministério Público e de outros órgãos, assim como a
Polícia Federal. Desde 2014, tínhamos uma preocupação da interferência
do Executivo nos trabalhos e isso poderia ser feito de várias formas",
indicou.
"Foi garantida a autonomia da Polícia Federal nas investigações. O governo tinha crimes gigantescos de corrupção, mas foi fundamental a autonomia da PF para realizar o trabalho. Isso permitiu que os resultados fossem alcançados. É um ilustrativo da importância de garantir o estado de direito, a autonomia das instituições. Num domingo qualquer, durante as investigações, o superintendente Valeixo recebeu uma ordem de soltura ilegal do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e foi graças à autonomia dele que ele comunicou às autoridades judiciárias e foi possível rever essa ordem. Demonstra o empenho dessas autoridades e da autonomia", afirmou Moro, que citou a "carta branca" dada por Bolsonaro no início de seu trabalho.
"No final de 2018, recebi o convite do então eleito Jair
Bolsonaro e isso já falei publicamente. Fui convidado a ser ministro. O
que foi conversado com o presidente é que teríamos um compromisso com o
combate à corrupção e criminalidade. Foi me concedida carta branca para
nomear os assessores desses órgãos. O presidente concordou e disse que
me daria carta branca. Tive experiência por trabalhar na Polícia e como
juiz. Aceitei para fazer com que as coisas evoluíssem. Entendi que a
decisão foi bem acolhida pela sociedade. Estando no governo, me vi como
garantidor da lei e da imparcialidade das instituições", explicou.
Moro aceitou o convite e integrou o governo em novembro de
2018. Há meses, a relação entre o presidente e o ex-juiz da Operação
Lava Jato vem se deteriorando, com a atuação de Moro e sua autoridade
reduzida.
Além do comando da Polícia Federal (PF), Moro coleciona
conflitos com Bolsonaro. Um exemplo é o pacote anticrime, principal
projeto do ministro no governo e que não recebeu a atenção esperada do
governo durante o tempo que tramitou no Congresso. Após ser aprovado, o
presidente também não atendeu a maior parte das sugestões de veto feitas
por Moro.
No mesmo período, Bolsonaro sancionou o projeto que institui a
figura do juiz de garantias nos processos, mesmo com Moro contrário ao
projeto.
Exemplos como esses foram minando a confiança e a relação
entre os dois, uma vez que Moro não tem o poder prometido e Bolsonaro
não encontrou no ministro o defensor desejado. Mais de uma vez, a
imprensa nacional registrou a insatisfação do presidente com a falta de
apoio público por parte de Moro, como aconteceu agora na crise do
coronavírus.
VAZA JATO
A biografia de Moro também fica marcada pelo vazamento de
supostas mensagens trocadas com os procuradores da Operação Lava Jato,
em especial o coordenador da operação no Ministério Público Federal
(MPF), Deltan Dallagnol. Os diálogos, obtidos pelo site The Intercept
Brasil e compartilhado com veículos como Folha de S. Paulo, El País,
Buzzfeed News e o jornalista Reinaldo Azevedo, destacam a interferência
do então juiz no trabalho do MPF.
Por exemplo, logo nas primeiras publicações da série conhecida como "Vaza Jato", o Intercept abordou os processos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), condenado por Moro no caso do triplex do Guarujá. As conversas mostram que o ministro discutia estratégias com Dallagnol e até adiantou o resultado de uma decisão, o que é ilegal, já que ele ocupava o posto de juiz responsável pelos processos da Lava Jato (lembre aqui). Tanto Moro quanto Dallagnol nunca admitiram a veracidade do conteúdo.
Por Ailma Teixeira / Ulisses Gama / Bahia Notícias
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