O filósofo e psicanalista Fabiano de
Abreu faz uma análise sobre as transformações que a pandemia da covid-19
trouxe aos nossos costumes e hábitos e quais serão os reflexos disso no
futuro.
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Ainda
longe do fim, a pandemia do novo coronavírus já causou transformações
profundas em nossa sociedade e no seu modo de vida. No entanto, alguns
estudiosos acreditam que após o desenvolvimento da vacina e a derrota
desta doença, muitas destas transformações serão perenes.
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O filósofo e psicanalista Fabiano de Abreu têm
conduzido uma série de estudos teóricos sobre os impactos da covid-19
na sociedade de agora e os possíveis desdobramentos no futuro: “Em uma
sociedade pós pandemia ganharemos novos costumes e moldaremos antigos
comportamentos. Nosso organismo já sofria com os efeitos de uma
inadaptação à essa brusca virada em nossa chave cronológica.”
Aceleração das mudanças
Abreu
ressalta que é preciso um período de milhares de anos para nos
adaptarmos a certas mudanças e que agora estamos presenciando a
aceleração deste processo: “por exemplo, a internet, chegou e nos mudou
de forma abrupta. Como consequência o sentimento de solidão nos
acompanhava. Já vínhamos nos sentindo sós, em meio a tantos rostos
virtuais, forçosamente nos vemos impelidos a um tipo de interação dentro
de uma nova realidade que é a virtual. São milhares de rostos que
podemos conectar a qualquer momento, mas sentíamos e ainda sentimos que
nenhum deles consegue nos enxergar como somos verdadeiramente, ou até
mesmo, quando fingimos ser quem não somos, e forjamos um perfil que
gostaríamos que fosse real. A força da presença física traz uma outra
dimensão à comunicação humana, para além da palavra dita ou escrita, ela
causa um impacto emocional que traduz a essência singular de cada um de
nós, através do nosso comportamento.”
Vida alternativa
O
filósofo aponta que agora, onde somos forçados ao isolamento social
para conter a pandemia, a vida virtual tentou esconder a nossa
humanidade: “enquanto pensávamos que as nossas fragilidades e a nossa
humanidade poderia ser manipulada através de uma tela de um gadget,
ganhamos voz em forma escrita e falada, e percebemos que a nossa voz
tinha e ainda tem o poder de percorrer o mundo em frações de segundos,
tanto para o bem, quanto para o mal. Mesmo
que alguns se sentissem protegidos pela tela que nos separa, as
agressões e as fake news demonstraram o poder que possuem, e nós nos
tornamos seus reféns. Mas na vida não há crime sem castigo, estão nas
consequências das nossas ações.”
Fim das vidas perfeitas de mentirinha
Para
Fabiano de Abreu, a pandemia fez muitos caírem na real e sairem do
conto de fadas das redes sociais: " a pandemia nos forçou a solidão e
modificou o nosso olhar para a importância do virtual e para o futuro
das relações humanas. De maneira impositiva e literal, tivemos que
deixar um pouco as “selfies” de lado, a exposição e ostentação das
nossas vidas “perfeitas”, para enaltecer o “self”, ou seja, o Si mesmo.
Somos nós mesmos a maior ameaça à nossa própria sobrevivência, mais do
que o vírus. A pandemia nos fez iguais. O vírus não atinge apenas os
pulmões dos pobres e não imuniza os ricos, para ele, ninguém é melhor
que ninguém.”
Abreu admoesta que nunca tivemos a percepção tão
exata do quanto somos finitos: “A finitude é um axioma e é totalmente
democrática. Se já nos sentíamos perdidos, ao perdermos momentaneamente o
contato físico, passamos a valorizá-lo como nunca antes, pois é o que
dizem: Só damos valor às coisas e as pessoas quando as perdemos. Dessa
perda surgiu a necessidade de amor ao próximo, surgiu também a certeza
de que dependemos uns dos outros para viver, e mais forte ainda,
dependemos uns dos outros para que possamos sobreviver ao vírus.”
Um novo normal
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O
estudioso aponta que países que obedeceram as determinações de
isolamento social, em respeito a própria vida e a vida dos demais, aos
poucos, estão se abrindo para um novo normal, onde tudo parece estar bem
diferente: “Aquelas sociedades que ainda não tomaram consciência da
gravidade da pandemia e de sua força, e que não respeitaram o isolamento
social, estenderão os seus dias de sofrimento e demorará ainda mais até
que possam experimentar esse novo estilo de vida. Perdemos vidas,
perdemos recursos financeiros, perdemos o contato com a família e com os
amigos, perdemos a oportunidade de lazer, de diversão e confraternizar,
perdemos a liberdade de ir e vir. Mas ganhamos tempo com a família,
ganhamos a oportunidade de dar atenção de qualidade aos nossos filhos,
ganhamos uma maior consciência planetária, ambiental, e principalmente,
constatamos, finalmente, a importância do autoconhecimento e do
desenvolvimento da inteligência emocional.”
As principais transformações com a covid-19 já se podem sentir, e devem perdurar: o consumismo desenfreado deu lugar a um senso de necessidade, de reaproveitamento, de consciência. Ganhamos também tempo para valorizar o que não valorizávamos como deveríamos.
Ganhamos tempo para repensar, projetar, reinventar e aproveitar a vida interior. Passamos a nos preocupar com o próximo, com o vizinho, com o sem teto, com os profissionais da saúde, com os idosos, que antes, nos faltava tempo e compaixão. Muitas destas mudanças irão refletir nas próximas gerações, pois a evolução não espera a vontade do homem, nós é que precisamos adquirir conhecimento para nos adaptar a essa nova realidade, o quanto antes, essa será a base para uma vida em equilíbrio. E para nos sentirmos felizes nesse novo que já chegou, precisaremos uns dos outros, precisaremos nos unir, precisaremos cuidar uns dos outros.
Fonte: Jennifer da Silva / Suporte MF Press Global
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