Após dois dias seguidos com recorde de mortes e divulgação tardia
dos números, o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido)
justificou a mudança na metodologia de divulgação sobre vítimas da Covid
- que pode significar, na prática, a divulgação de números de mortes
menores.
Ministro interino, Eduardo Pazuello |
Em uma nota postada por Bolsonaro nas redes sociais, o
Ministério da Saúde afirma que o formato usado desde o início da
pandemia não oferece uma representação do "momento do país".
Questionado sobre a mudança da metodologia na manhã deste
sábado (6), durante uma visita que fez a Formosa (GO), Bolsonaro não
quis responder.
O novo modelo já começou a ser usado no boletim da noite
desta sexta-feira (5), quando foi divulgado que o país registrou 1.005
óbitos nas últimas 24 horas. O boletim do Ministério da Saúde não
informou o total de mortes e nem o total de casos confirmados da Covid
desde o início da pandemia.
A pasta também deixou de divulgar o total de casos em
investigação para a doença, que até quinta-feira (4) era de 4.159. O
portal do Ministério da Saúde com as informações consolidadas saiu do
ar.
As mudanças acontecem depois do país registrar dois dias
seguidos com recorde de mortes em um intervalo de 24 horas. Na
quarta-feira, foram 1.349 óbitos.
No dia seguinte, quando o Brasil teve um novo recorde de
mortes (1.473), atingindo a marca de um morto por minuto em decorrência
da Covid-19.
A nota do Ministério da Saúde indica que a pasta vai passar
a divulgar apenas os números de mortes e casos de infecção pelo
coronavírus registrados nas últimas 24 horas, o que resultaria em
números muito inferiores aos atuais.
Desde o início da pandemia, o Ministério vem divulgando com
destaque os números de mortes e casos que foram confirmados para a
Covid-19 nas últimas 24 horas, incluindo casos de mortes ocorridas em
outras datas, mas cuja confirmação para o coronavírus tenha ocorrido no
último dia.
O modelo que será abandonado também é usado na divulgação dos dados por praticamente todos os países do mundo.
O texto da nota argumenta que a divulgação dos dados de 24
horas permite acompanhar a realidade do país neste momento e definir as
melhores estratégias para o atendimento da população.
"A curva de casos mostra as situações como os cenários mais
críticos, as reversões de quadros e a necessidade de preparação",
informou o texto, que em seguida critica o modelo anterior de divulgação
dos dados.
"Ao acumular dados, além de não indicar que a maior parcela
já não está com a doença, não retratam o momento do país. Outras ações
estão em curso para melhorar a notificação dos casos e confirmação
diagnóstica", afirma o texto da nota.
O Ministério também defendeu a divulgação dos dados tarde
da noite, após as 22h. Na nota postada por Bolsonaro, a pasta argumenta
que havia o risco de subnotificação quando os boletins do coronavírus
eram tornados públicos às 17h (durante a gestão do ex-ministro Luiz
Henrique Mandetta) e às 19h (gestão de Nelson Teich).
Na primeira vez em que houve atraso na divulgação dos
dados, na quarta-feira (3), o Ministério da Saúde havia informado que
excepcionalmente os números seriam informados às 22h, devido a
"problemas técnicos". Naquele dia, o país registrou um recorde de 1.349
mortes em 24 horas.
No dia seguinte, quando o Brasil teve um novo recorde de
mortes (1.473), atingindo a marca de um morto por minuto em decorrência
da Covid-19, a pasta novamente divulgou o boletim após às 22h.
O horário de divulgação, portanto, se dá após a conclusão
dos principais jornais diários e também após a transmissão dos
telejornais do período da noite.
Ao comentar a questão, na sexta-feira (5), o presidente não
confirmou ter dado a ordem para a mudança de horário e alegou que os
números sairiam mais "consolidados" às 22h. Por outro lado, comentou que
"acabou matéria no Jornal Nacional", em referência ao telejornal da
Rede Globo.
"Não interessa de quem partiu [a ordem para modificar o
horário], é justo sair às 22h, é o dado completamente consolidado. Muito
pelo contrário, não tem que correr para atender a Globo", disse.
A nota postada por Bolsonaro também afirma que está havendo
adequamento de rotinas e fluxos para melhorar extrair os dados diários,
o que necessitaria, afirma o texto, aguardar os relatórios vindos das
secretarias de saúde dos estados e chegarem os dados.
"Para evitar subnotificação e inconsistências, o Ministério
da Saúde optou pela divulgação às 22h, o que permite passar por esse
processo completo. A divulgação entre 17h e 19h, ainda havia risco de
subnotificação", afirma o texto.
A mudança no horário de divulgação não foi a única mudança
registrada após as sucessivas trocas de ministros da Saúde. Após a saída
de Luiz Henrique Mandetta, por exemplo, as entrevistas coletivas para
explicar os números e apresentar as medidas de combate à pandemia
deixaram de serem diárias.
O fluxo de entrevistas diminuiu ainda mais após a saída de
Nelson Teich, que permaneceu menos de um mês no cargo. Teich deixou a
pasta por divergência com o presidente a respeito do protocolo para a
administração da cloroquina e hidroxicloroquina para pacientes que não
estejam em estágio grave da Covid.
Com o atual ministro interino, o general Eduardo Pazuello,
as entrevistas coletivas passaram a contar apenas com técnicos da pasta
de segundo escalão, como secretários substitutos. O formato também
mudou. Os presentes deixaram de responder questões sobre a previsão de
pico da pandemia no Brasil.
O secretário substituto de vigilância em saúde, Eduardo
Macário, também já havia criticado as perguntas sobre o atual estágio da
pandemia no Brasil e criticou a imprensa por usar as expressões
"recorde de mortes".
Por Renato Machado | Folhapress
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