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terça-feira, 24 de setembro de 2024

Doméstica escravizada por 44 anos em Porto Seguro receberá indenização de meio milhão de reais

O valor terá que ser quitado até fevereiro de 2025, prazo limite para a venda de dois imóveis que pertenciam à empregadora.
Essa história começou igual à de muitas outras brasileiras que ainda na infância foram entregues para famílias abastadas para trabalhar como empregadas domésticas e permaneceram por décadas em situação análoga à de escravos. Dessa vez, no entanto, a sina de Maria, nome fictício usado para preservar a identidade e a segurança da vítima, teve um desfecho positivo. O acordo firmado com a família da patroa pelo Ministério Púbico do Trabalho (MPT) e pela advogada da vítima vai garantir uma chance de futuro para quem teve seu passado apagado.


Maria sequer tinha certidão de nascimento, que foi obtida pela patroa muitos anos depois e com informações de filiação inverídicas. Trabalhou até a morte dos patrões numa casa e numa fazendo no sul baiano.

Como não há qualquer informação sobre sua origem e registros de que não falava português quando chegou para trabalhar com 6 anos, suspeita-se que tenha origem no continente africano. A vida dela, no entanto, começa quando após a morte da patroa, vai morar com um dos filhos da ex-empregadora, sofre maus-tratos e decide procurar ajuda.  

O amparo veio primeiro por uma amiga da vizinhança, depois por uma advogada que resolveu se envolver na situação e buscar órgãos públicos e depois pelo Centro de Referência em Assistência Social (Creas) e pelo MPT.

Hoje, Maria está empregada com carteira assinada e vivendo num imóvel alugado. Estuda à noite para finalmente se alfabetizar e vive seu primeiro relacionamento amoroso. Com o acordo firmado no mês passado e já homologado pela Justiça do Trabalho, ela vai receber indenização de R$500 mil, que deve ser quitada até fevereiro.  

O valor será obtido com a venda pelos dois herdeiros da empregadora de uma casa e uma fazenda. Até o prazo dado no acordo para a conclusão da venda, os dois filhos da ex-patroa estão mantendo o pagamento de um salário mínimo mensal.

Oportunidade“Esse é um daqueles casos em que a gente vê tudo o que não poderia existir numa relação de trabalho. E apesar de entendermos que nenhum valor poderia pagar o que essa senhora passou, conseguimos fazer um acordo que permitirá a ela uma oportunidade de construir uma vida digna”, afirmou a procuradora do MPT Camilla Mello, autora da ação e que acompanha o caso até hoje, mesmo após sair da unidade do MPT de Eunápolis, onde a ação segue agora sob a responsabilidade do procurador Ricardo Freaza.  

Foi ele quem assinou o acordo junto com a advogada da vítima, Marta de Barros, que também moveu ação individual. O acordo quita tanto a ação individual quanto a ação civil pública do MPT.  

O caso aconteceu no município de Porto Seguro, no extremo sul da Bahia. Aos 6 anos, Maria, chegou à casa de Heny Peluso Loureiro, falecida no ano passado, e seus filhos, para trabalhar como doméstica. Não estudou, não fez amizades, nem teve relacionamento amoroso.

Viveu para servir e nada recebia por isso, além de casa e comida. Após a morte da patroa, passou a viver com o filho de sua primeira empregadora. Ele tentou cadastrar Maria para receber benefícios sociais e a situação chamou a atenção da assistência social.  

A equipe do Creas decidiu visitar a casa de Maria para encaminhar o pedido de inclusão no CAD Único. A situação de Maria começava a ser revelada.  

Rede de apoio  
Foi nesse momento que conseguiu sair de casa, encontrar uma rede de apoio e uma advogada que a orientou e levou o caso para órgãos de proteção dos direitos humanos. O MPT abriu inquérito para apurar a situação.

Depois da investigação e de tentativas frustradas de acordo extrajudicial, foi necessário ingressar com uma ação civil pública. Em paralelo, a advogada de Maria ingressou com um processo na Justiça do Trabalho cobrando o pagamento das verbas trabalhistas.  

No fim do mês passado, MPT e os representantes do espólio da patroa e os dois filhos chegaram a um acordo, que teve a participação da vítima. No documento assinado por todos e já homologado pela Justiça do Trabalho, onde a ação corria, os empregadores não reconhecem culpa, mas se comprometem a pagar R$500 mil a título de indenização por danos morais e a regularizar a carteira de trabalho de Maria.  

O valor terá que ser quitado até fevereiro de 2025, prazo limite para a venda de dois imóveis que pertenciam à empregadora, sob pena de multa de 50% desse valor. 

Fonte: Ascom MPT-BA | Extraída do Acorda Cidade

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