Apenas dois policiais civis trabalham por plantão em Cachoeira. O jeito é sair em dupla à caça do fundador do Primeiro Comando do Interior. Com apenas uma carabina e uma pistola, estão os representantes da Polícia Civil de Cachoeira que tentam capturar Edmilson Bispo dos Santos Júnior.
Todas as manhãs, ele toma banho na Prainha, às margens do Rio Paraguaçu, em Cachoeira, Recôncavo da Bahia. Almoça tucunaré nos bares à beira do rio, transa com prostitutas da Rua do Brega e ainda arrasta meninas para os trilhos do trem para tomar espumante após noites de orgia.
Essa é a rotina do traficante Edmilson Bispo dos Santos Júnior, 27 anos, fundador da facção Primeiro Comando do Interior (PCI) que propaga que tem o corpo fechado em três terreiros de candomblé.
Na trincheira oposta, com apenas uma carabina e uma pistola, estão os representantes da Polícia Civil de Cachoeira que tentam capturar o homem que se inspirou na facção paulista Primeiro Comando da Capital (PCC).
Ontem, o CORREIO acompanhou a operação do delegado Laurindo Neto e do investigador Renilson Mota dos Reis na tentativa de capturar o traficante. Sim, a operação contou apenas com dois policiais - efetivo normalmente disponível na Polícia Civil de Cachoeira por cada plantão.
O CORREIO acompanhou a operação do delegado Laurindo Neto e do investigador Renilson Mota dos Reis na tentativa de capturar o traficante
“Estamos ungidos pelo poder de Deus para nos proteger. Mesmo em número pequeno, Deus está do nosso lado. Quer exército maior?”, diz o delegado, que é evangélico, antes de iniciar a caçada.
Mesmo com rotina regrada, a extensa rede de contatos de Júnior dificulta a sua captura, independentemente do efetivo policial. Com direito a ter que se esconder de tiros deflagrados num matagal, a reportagem percorreu com a polícia os cinco locais onde Júnior mantém apoio na cidade - Linha do Trem, bairro Morumbi, bairro Manoel Vitório, Viradouro e Rua do Brega.
“Ele monitora todos os passos da polícia através de informantes que circulam na cidade com celulares e avisam sobre os nossos deslocamentos”, revela o delegado, que assumiu a titularidade da Delegacia de Cachoeira há quatro meses.
Transportando pedras de crack em fundos falsos de gaiolas de passarinho, soldados do tráfico a serviço de Júnior atravessam a cidade pela linha férrea centenária que passa a apenas 100 metros da delegacia.
“Eles ficam em cima da linha do trem levando a droga para um lado e para outro. Pela linha do trem, os bandidos chegam até o bairro Viradouro - conhecida como a cracolândia de Cachoeira”, explica Laurindo Neto.
Apreensões
No Viradouro, a zona de conflito se configura com mais intensidade. Ontem, a polícia apreendeu no bairro uma faca, um cigarro de maconha, cachimbo para crack e um celular usado por informantes de Júnior.
No matagal dividido pela linha do trem, foi preciso atirar. “Fizemos isso por estarmos com um número pequeno de policiais. Temos que buscar sempre estratégias para surpreender os soldados de Junior”, explicou o delegado. No bairro, segundo a polícia, há aproximadamente 20 traficantes trabalhando com a anuência de Júnior. “Só vende droga em Cachoeira quem Júnior permite”, diz Neto.
Aviões
Para manter o funcionamento do seu esquema de informantes, Júnior conta com o apoio de adolescentes e alguns motociclistas, que agem camuflados de mototaxistas. “Eles fazem o transporte da droga para São Félix e cidades próximas com motos e usam até canoas para atravessar o Rio Paraguaçu”, diz o delegado.
Suspeito de ser informante de Júnior é abordado durante incursão
São os aviões do tráfico os responsáveis pelos assaltos nos centros comerciais de Cachoeira. Ontem, durante a incursão dos dois policiais, um menor teve seu celular apreendido pelo delegado, que suspeita que o jovem seja informante de Júnior. “Em situações suspeitas apreendemos os celulares e mandamos a pessoa pegar na delegacia de posse da nota fiscal. Quem está limpo vai, quem está sujo e envolvido com Júnior nem lá aparece”, contou Neto.
Esconderijos
As escadas íngrimes e estreitas do bairro Morumbi são desafiadoras para a polícia e úteis para Júnior e seu bando. “Eles sobem isso aqui e somem rápido”, conta o fiel escudeiro do delegado, o ex-comerciário e hoje policial Renilson Mota dos Reis.
Do alto do bairro Manoel Vitório, Júnior tem ampla visão de Cachoeira e São Félix. “Nas casas que dão acesso ao bairro, cachorros são usados para proteger os esconderijos das drogas. Já matamos três que nos atacaram em caçadas aos bandidos”, disse Mota. Em algumas das tais caçadas, a Polícia Civil conta com o apoio do único carro da PM da cidade. “Mas nem sempre é possível. Quando não podem, temos que ir na dupla”, diz Mota. Ontem, numa caçada em dupla, Júnior mais uma vez não foi achado. (Correio)